Violência doméstica e seus reflexos
- siteescritoriobrun
- 1 de fev. de 2022
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Atualizado: 3 de fev. de 2022
Antes de efetivamente tratarmos sobre as circunstâncias posteriores a um episódio de agressão, se faz necessário delimitar os tipos de violência elencados na Lei n° 11.340/2006, denominada Lei Maria da Penha, tendo em vista que, um dos fatores prejudiciais na responsabilização do agressor é, justamente, o fato de a vítima não identificar que está no âmbito de violência doméstica.
A Lei Maria da Penha, delimitou como formas de agressão, não apenas a violência física, mas também psicológica, que comumente antecedem àquela com humilhações, manipulação, xingamento, dentre outros.

A Lei também prevê a violência patrimonial, pouca abordada em razão da dificuldade de demonstração, mas muito recorrente como um mecanismo para causar dependência da vítima em relação ao agressor.
Ainda, a violência moral que atinge a honra da vítima e, por fim, a violência sexual, também difícil de ser identificada, pois não se trata apenas de constrangimento ou do uso da força, mas presente na proibição de uso dos métodos contraceptivos, ou no forçar uma gravidez, aborto e afins.
Nesse sentido, denota-se extremamente importante enunciar que, independentemente da violência a que a mulher é submetida, imprescindível se socorrer dos meios legais para resguardo de seus direitos, notadamente, de sua integridade física e máxime, sua vida, além de outros.
A mulher vítima de qualquer das agressões, deverá, primeiramente, se dirigir a uma delegacia da mulher ou qualquer outra mais próxima, para fins de lavratura de Boletim de Ocorrência, dado que será, consequentemente, na hipótese de hematomas ou lesões outras, ao Instituto Médico Legal para o exame de corpo de delito, onde terá tratamento prioritário com o direito, inclusive, de ser atendida por uma mulher. Caso haja necessidade, serão designados policiais a fim de acompanhar a vítima para a retirada de seus pertences do local da agressão ou de seu domicílio.
Com o registro da ocorrência, o Delegado de Polícia, atendendo-se às cautelas que o caso requer, representará em até 48 horas pela concessão de Medidas Protetivas, que de acordo com o artigo 22, da referida Lei, serão:
I - suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão competente, nos termos da Lei no 10.826, de 22 de dezembro de 2003;
II - afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida;
III - proibição de determinadas condutas, entre as quais:
a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite mínimo de distância entre estes e o agressor;
b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação;
c) frequentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e psicológica da ofendida;
IV - restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar;
V - prestação de alimentos provisionais ou provisórios.
Além dessas medidas, será assegurada à vítima, a manutenção do vínculo trabalhista, quando necessário o afastamento do local de trabalho, por até seis meses. Observe o art. 9º, § 2º, II, da Lei Maria da Penha:
“Art. 9º (…)
§ 2º O juiz assegurará à mulher em situação de violência doméstica e familiar, para preservar sua integridade física e psicológica: II – manutenção do vínculo trabalhista, quando necessário o afastamento do local de trabalho, por até seis meses.”
Importante enunciar que a normativa assegura a manutenção do vínculo laboral e, não, dos proventos. Assim é que, o Tribunal Superior do Trabalho se posiciona no sentido de que a necessidade de afastamento e consequente manutenção do vínculo se submete a natureza de “suspensão do contrato de trabalho”, motivo pelo qual inexistirá contraprestação pelo empregador, senão vejamos:
“(…) Esclarece-se que a questão ora tratada não se confunde com as hipóteses previstas no artigo 9º, § 2º, incisos I e II, da Lei nº 11.340/2006, sendo aquelas hipóteses, sim, de competência dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, ou supletivamente, das varas criminais. Isso porque, naquelas hipóteses, em sendo a vítima servidora pública, pode o juiz da ação determinar sua remoção, ou sendo empregada, o afastamento do local do trabalho e manutenção do vínculo de emprego. Ou seja, trata-se de hipótese legal de suspensão do liame empregatício por ordem judicial, sem a percepção de remuneração. (…)” (AIRR-608-59.2017.5.10.0014, 2ª Turma, Relator Ministro Jose Roberto Freire Pimenta, DEJT 14/12/2018).
Inobstante, entende que é devido o pagamento de auxílio-doença pelo Instituto Nacional de Seguridade Social – INSS, delimitando apenas os 15 (quinze) primeiros dias à cargo do empregador. Nesse sentido:
RECURSO ESPECIAL. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR. MEDIDA PROTETIVA. AFASTAMENTO DO EMPREGO. MANUTENÇÃO DO VÍNCULO TRABALHISTA. (…) INTERRUPÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO. PAGAMENTO. (…) FALTA JUSTIFICADA. PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO. AUXÍLIO DOENÇA. INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL. (…) 2. Tem direito ao recebimento de salário a vítima de violência doméstica e familiar que teve como medida protetiva imposta ao empregador a manutenção de vínculo trabalhista em decorrência de afastamento do emprego por situação de violência doméstica e familiar, ante o fato de a natureza jurídica do afastamento ser a interrupção do contrato de trabalho, por meio de interpretação teleológica da Lei n. 11.340/2006. 3. Incide o auxílio-doença, diante da falta de previsão legal, referente ao período de afastamento do trabalho, quando reconhecida ser decorrente de violência doméstica e familiar, pois tal situação advém da ofensa à integridade física e psicológica da mulher e deve ser equiparada aos casos de doença da segurada, por meio de interpretação extensiva da Lei Maria da Penha. 4. Cabe ao empregador o pagamento dos quinze primeiros dias de afastamento da empregada vítima de violência doméstica e familiar e fica a cargo do INSS o pagamento do restante do período de afastamento estabelecido pelo juiz, com necessidade de apresentação de atestado que confirme estar a ofendida incapacitada para o trabalho e desde que haja aprovação do afastamento pela perícia do INSS, por incidência do auxílio-doença, aplicado ao caso por meio de interpretação analógica. (…) (REsp 1757775/SP, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 20/08/2019, DJe 02/09/2019).
Daí porque, prezando pela segurança e subsistência da vítima, com base nessa premissa, o legislador trouxe a incidência da concessão de auxílio-doença, nos termos do art. 60, caput e § 3º, da Lei 8.213/91:
Art. 60. O auxílio-doença será devido ao segurado empregado a contar do décimo sexto dia do afastamento da atividade, e, no caso dos demais segurados, a contar da data do início da incapacidade e enquanto ele permanecer incapaz. § 3º Durante os primeiros quinze dias consecutivos ao do afastamento da atividade por motivo de doença, incumbirá à empresa pagar ao segurado empregado o seu salário integral.
O afastamento do lar pela vítima, também, não prejudicará seus direitos relativos aos bens, alimentos ou guarda dos filhos. Inclusive, poderá o Juiz determinar a suspensão das visitas, na hipótese de a violência se estender aos filhos. Poderá da mesma forma, determinar liminarmente medidas que protejam o patrimônio impedindo temporariamente a celebração de Contratos de Compra e Venda e seus derivados, restituição de bens subtraídos pelo agressor, suspensão de procurações concedidas pela vítima ao agressor e por fim a prestação de caução provisório, mediante depósito judicial, por perdas e danos materiais decorrente da prática e violência doméstica e familiar.
Todo o processo judicial, que tramitará no Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra Mulher, correrá no domicílio da vítima, evitando qualquer tipo de problemas com acessibilidade, fugindo a regra dos demais procedimentos.
Não é demais acrescentar que simultaneamente ao Inquérito Policial ou Ação Penal que têm o objetivo de apurar a responsabilidade do agressor, a vítima poderá se valer de outras demandas a fim de resguardar todos os direitos inerentes ao término do relacionamento, por exemplo.
Portanto, à vista de um cenário de violência doméstica, cuja consequência seja o término da relação ou mesmo o divórcio, imprescindível o auxílio de um profissional especializado para o fim de resguardar todos os direitos inerentes à integridade física, psíquica e correlacionados, leia-se, inerente aos filhos e ao patrimônio, quando existentes.








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